Erêndira! Sim, avó…

Teatro «A Barraca»

Erêndira! Sim, avó…

Teatro


Domingo, 8

21:00, Avanteatro, Palco

“Estava Erêndira a dar banho à Avó quando começou o vento da sua desgraça”. É com estas palavras que o prémio Nobel da literatura, Gabriel García Marquez, abre a novela curta que está na base deste espectáculo. Usando como pano de fundo a triste realidade da exploração sexual de menores na profunda Colômbia mágica, Gabo dá-nos a conhecer a relação de exploração entre uma Avó desalmada e uma neta cuja candidez e cega obediência suporta extremos de violência sexual impensáveis. “Se as coisas continuarem assim pagas-me a dívida dentro de oito anos, sete meses e onze dias.“, contabiliza a Avó. Se tivermos em conta que a média diária são setenta homens a quem Erêndira presta por dia os seus serviços, teremos ideia do nível da exploração que este corpo de 14 anos acabados de fazer terá de suportar, da crueldade da avó e do desnorte a que chega uma sociedade indígena violentada por missionários evangelizadores e regida por militares sem escrúpulos. Não podendo olhar para esta narrativa senão como uma metáfora, e tendo em conta que García Marquez é um escritor que aliou como poucos uma escrita mágica às preocupações sociais e politicas, não é estranho que ela nos evoque imediatamente a relação de exploração existente entre países ricos e países pobres. A dívida de Erêndira; nascida de um descuido numa desgraçada noite de vento em que, caída de cansaço, adormeceu antes de apagar uma vela; vai aumentando à medida que a paga. A avó rejuvenesce a cada pagamento que recebe da mão dos tais setenta homens que por dia se servem de Erêndira. Rumo ao mar, embalada pelos amores sonhados com contrabandistas sedutores a caminho da travessia para a desejada ilha de Aruba, a baleia irá morrer na praia às mãos de Ulises amantíssimo anjo libertador de uma Erêndira que nunca mais parará de correr.

Para a estrutura do trabalho de adaptação, inspirei-me nas Station Plays, prodigiosa herança novecentista do teatro medieval que, ao libertar-nos da prisão da narrativa realista, permite que de estação em estação o espectáculo estacione para o teatro ter lugar. Esta opção nasce do reconhecimento de que, na escrita de García Marquez existe uma Erêndira que é também ela, na sua itinerância, uma mártir levada, de estação em estação, a cumprir a sua Paixão, o seu Calvário.

E então o espectáculo. E então escolher, abdicar, experimentar. Encontrar um espaço cénico que permita contar uma história que atravessa a Colômbia imaginada de García Marquez, ir ao encontro de um ambiente que permita ao realismo mágico respirar. Aplicar recursos múltiplos e usá-los sempre de modo a perseguir a artesanalidade inaugural de todos os desfloramentos. A artesanalidade dos pobres. Neste teatro não está o texto no centro, não está a palavra na boca do actor. O texto de García Marquez é um texto de imagens, um texto para ser imaginado, não para ser dito mas para ser lido. Para ser visto com a imaginação.

Rita Lello

FICHA TÉCNICA

Direcção e Adaptação Rita Lello | Assistente Encenação Rita Soares | Espaço Cénico Rita Lello | Carpintaria Mário Dias | Figurinos Maria do Céu Guerra | Adereços Marta Fernandes da Silva | Assistente Guarda-Roupa Sérgio Moras | Costureira Zélia Santos | Selecção Musical Rita Lello | Música original e arranjos João Maria Pinto | Desenho de Luz, Video e Edição Paulo Vargues | Sonorização Ricardo Santos | Assistência à Montagem Fernando Belo | Animações Paulo Vargues | Relações Públicas e Produção Inês Costa, Paula Coelho, Sónia Barradas | Fotografia Ricardo Rodrigues | Elenco Maria do Céu Guerra, João Maria Pinto, Sara Rio Frio, Adérito Lopes, João Teixeira, Rita Soares, Ruben Garcia, Samuel Moura, Sérgio Moras, Alexandre Castro, David Medeiros, João Parreira (primeiro elenco), Diogo Varela (primeiro elenco)

Erêndira! Sim, avó…

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